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Dar 20 mil euros a jovens pode acabar com a desigualdade?

Think tank de Berlim sugere que jovens recebam herança básica, sem comprovação de renda, para investirem em educação, casa própria ou abrir um negócio. Dinheiro poderia aumentar riqueza da metade mais pobre em até 94%.


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Em dezembro de 2021, enquanto a atenção do mundo estava voltada para a ômicron, a nova variante do coronavírus, o Instituto Alemão de Pesquisa Econômica (DIW) reavivou uma ideia centenária para ajudar a combater a desigualdade econômica.

Como herança básica universal, ou "Grunderbe" em alemão, seriam destinados 20 mil euros (cerca de 126 mil reais) a cada residente quando ele completar 18 anos de idade. O dinheiro seria destinado à formação profissional, aquisição de moradia ou financiamento de um negócio próprio, mas não poderia ser desperdiçado.

A ideia é semelhante à da Renda Básica Universal, um esquema de substituição social em teste em outros países, que concede às pessoas uma renda mínima mensal sem averiguação prévia da condição financeira.

"Se realmente queremos criar prosperidade para todos num futuro previsível, então devemos reduzir o alto nível de desigualdade econômica através da redistribuição, dando uma herança básica à metade da população que não tem bens", escreveu em sua proposta para o think tank o especialista alemão em impostos Stefan Bach.

Bach disse que se o dinheiro fosse dado aos cerca de 750 mil jovens residentes na Alemanha que completam 18 anos a cada ano, a herança universal custaria ao governo alemão cerca de 22,6 bilhões de euros anuais. Ela poderia ser financiada através do aumento do imposto sobre heranças, a introdução de um imposto para ultrarricos e reformando os impostos sobre imóveis.

Dez por cento detêm 67% da riqueza

De acordo com a consultoria, a riqueza na Alemanha é fortemente concentrada em comparação com outros países com distribuição de renda semelhante. Os 10% mais ricos possuem dois terços do total da riqueza privada (cerca de 12 trilhões de euros em ativos, o equivalente a R$ 75 trilhões); cerca de 30% do patrimônio privado se concentra nas mãos do 1% mais rico, enquanto os 0,1% mais ricos possuem até 20%.

A metade inferior da tabela possui poucos ou nenhum ativo − apenas 1,3% do total da riqueza privada, e não sobra quase nada quando membros da família morrem, de acordo com um estudo do Forum New Economy (Fórum Nova Economia, com sede em Berlim).

Bach disse que simulações mostraram que um esquema de herança universal reduziria o coeficiente de Gini – dado estatístico usado para avaliar a distribuição de riqueza ou o grau de concentração de renda em um determinado grupo − em 5 a 7%. A herança poderia aumentar a riqueza da metade mais pobre entre 59% e 94%.

Se o novo governo do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, realmente quisesse abordar a desigualdade, disse Bach, ele deveria "concentrar-se no aumento da riqueza da classe média, apoiando a aquisição da casa própria, a provisão de pensão complementar e ativos financeiros".

"Para os grupos de baixa renda, a pensão complementar e ativos financeiros são particularmente relevantes", acrescentou. Em seu acordo de coalizão, os partidos no governo falaram sobre medidas para apoiar a criação de riqueza, incluindo a promoção da casa própria, pensões privadas e abatimentos no imposto de renda.

Mujica fala sobre uma sociedade mais igualitária

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Outros países são pressionados a adotar propostas semelhantes. No Reino Unido, a Campanha pela Herança Universal exigiu a concessão de uma "quantidade mínima decente de capital" para aqueles que chegam aos 25 anos de idade, "quaisquer que sejam as fortunas, desgraças, generosidade ou falta de generosidade de seus pais".

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, foi eleito em 2019 e ganhou o referendo sobre o Brexit com uma promessa de reduzir a desigualdade econômica entre o próspero sudeste da Inglaterra, que inclui Londres, e o resto do país.

"Muito se fala em 'nivelamento por cima' pelo governo conservador, mas dificilmente se fala em herança universal, o que é obviamente uma forma clara de nivelar as oportunidades para a maioria das pessoas", disse Dane Clouston, diretor da Campanha pela Herança Universal, à DW.

Dinheiro dos pais

Em seu site, a campanha britânica diz que "a igualdade de oportunidades e a distribuição da riqueza herdada estão indissociavelmente ligadas". "Aqueles que se beneficiam da pretensão de que a igualdade de oportunidades nada tem a ver com a distribuição da riqueza herdada... são os herdeiros da próxima geração de famílias que possuem a maior parte da riqueza empresarial, agrícola e acionária − vastas quantidades das quais foram e são recebidas por eles completamente livres de impostos como resultado de uma série de isenções escandalosas", acrescenta o site.

Sempre que os políticos na Europa e nos EUA ameaçaram introduzir novosimpostos sobre a riqueza, os ricos muitas vezes ameaçam se mudar para países com impostos mais baixos.

"O imposto sobre herança, em particular, é impopular − embora muito poucos sejam afetados", disse Bach. "Se os aumentos de impostos fossem utilizados para uma herança básica, eles seriam certamente mais fáceis de transmitir aos ricos".

Questão demográfica

Grande parte da desigualdade na Alemanha pode ser explicada através do envelhecimento da população, pois as pessoas mais velhas tiveram mais tempo para acumular riqueza do que as gerações mais jovens.

Embora a quantidade de poupanças seja alta, a maioria das pessoas mantém suas poupanças em contas de juros baixos, de modo que sua riqueza é corroída pela inflação ao longo do tempo. A baixa taxa de posses patrimoniais − apenas 45%, de acordo com o Banco Central alemão, em comparação com cerca de dois terços na França e no Reino Unido − também impede que muitas pessoas acumulem patrimônio em imóveis.

Por outro lado, os impostos sobre heranças e propriedades precisariam de grandes reformas, pois atualmente subvalorizam propriedades e ativos comerciais de propriedade dos ricos, afirma Bach, acrescentando que os impostos sobre riqueza representam apenas 1,1% de toda a receita tributária na Alemanha.

O ativista político americano de origem britânica Thomas Paine sugeriu pela primeira vez uma espécie de herança universal já em 1797. Segundo seu plano, todo homem e mulher receberia na época 15 libras (1.339 libras no valor de hoje), ao atingir a idade de 21 anos, pagos através do aumento dos impostos patrimoniais sobre os ricos.

Quase 200 anos depois, a ideia foi retomada pelo economista britânico Sir Anthony B. Atkinson, conhecido por seu trabalho na medição da desigualdade. Em 2015, Atkinson publicou seu último livro Inequality: What Can Be Done? (Desigualdade: O que pode ser feito?, em tradução literal), que também propôs o uso de impostos sobre patrimônio passado para as gerações seguintes para pagar uma forma de herança inicial aos que atingissem a maioridade.

A desigualdade econômica na União Europeia

As diferenças nos padrões de vida entre países da União Europeia são extremas. Mas, dependendo de como a riqueza é medida, há algumas surpresas – até quando se trata das nações em crise do bloco.

Foto: picture-alliance/dpa/D. Kalker
Statue "Europa" vor Europaparlament in Brüssel

Bulgária: salários baixíssimos

A Bulgária é considerada o país mais pobre da União Europeia e também aquele onde a corrupção é mais generalizada no bloco. Segundo a Germany Trade and Invest (GTAI), a renda bruta média em 2018 foi de apenas 580 euros por mês. Desde que o país ingressou na UE, vários jovens búlgaros deixaram sua terra natal, sendo muitos deles profissionais qualificados.

Foto: BGNES
Sófia

Romênia: o penúltimo lugar no ranking econômico da UE

Não se deixe enganar pela riqueza de cidades pitorescas cuidadosamente restauradas, como Brasov (foto), na Transilvânia. Com um Produto Interno Bruto (PIB) de 11.440 euros per capita (2019), o país está, de fato, numa posição melhor do que a Bulgária (8.680 euros). Mas com um salário médio bruto de 1.050 euros em 2019, ainda fica bem atrás da Alemanha (3.994 euros).

Grécia: saindo de uma crise para entrar em outra

Quando o país estava apenas começando a se recuperar dos efeitos da crise da dívida, em grande parte graças ao turismo dos últimos anos, veio a crise do coronavírus. Ainda que tenha um PIB per capita de cerca de 17.500 euros - aproximadamente o dobro do da Bulgária -, o país é considerado pobre se comparado à Alemanha.

França: país de proprietários de imóveis

Quando o assunto é riqueza média, os franceses estão muito à frente dos alemães. Com um patrimônio líquido de 26.500 euros (2018) per capita, os franceses possuem quase 10.000 euros a mais, de acordo com dados da Allianz, em parte devido à baixa participação imobiliária dos alemães. Na França, muitos chegam a ter até uma segunda casa no interior.

Itália: sem crescimento e altas dívidas

Entre os países europeus, a Itália foi particularmente atingida pela covid-19, com a cidade de Bérgamo rendendo manchetes como o epicentro da pandemia. Após cerca de duas décadas de estagnação econômica, o país é hoje um dos que defendem a distribuição de ajuda devido à pandemia entre os membros da UE. Com um PIB de 29.610 euros (2018) per capita, a Itália fica pouco abaixo da média do bloco.

Espanha: o pavor de uma segunda onda

Após um forte aumento nas infecções por covid-19, as autoridades da Catalunha reimpuseram limitações de circulação em julho. O país é extremamente dependente do turismo, que representa cerca de 15% do PIB. Com uma produção econômica per capita de 26.440 euros (2018), a Espanha fica abaixo da média da UE, de pouco menos de 31.000 euros.

Suécia: muita prosperidade, altos impostos e sem confinamento

A Suécia resolveu enfrentar a crise do coronavírus sem lockdown, o que, em comparação com seus vizinhos, acabou provocando muitas mortes. Com um PIB de 46.180 euros per capita, a Suécia fica em quinto lugar na Europa, atrás de Luxemburgo, Irlanda, Dinamarca e Holanda. Apesar dos altos impostos, os suecos ficaram à frente dos franceses em 2018, com um patrimônio líquido de 27.511 euros.

Países Baixos: riqueza e produção econômica elevadas

Ao lado da Suécia, Dinamarca e Áustria, os holandeses estão entre os países que rejeitam transferências bilionárias sem contrapartida de reformas para países como a Itália. Com um PIB de 46.800 euros per capita (2019) e um patrimônio líquido de mais de 60.000 euros per capita (2018), eles estão no topo do ranking da UE.

Alemanha: uma nação rica, mas os cidadãos nem tanto

Até agora, o país tem contornado a pandemia com sucesso. Os custos econômicos, no entanto, são enormes: as exportações caíram, e muitas empresas lutam para sobreviver. Detentora da maior economia da UE, a Alemanha teve um PIB de 41.340 euros (2019) per capita. Em 2018, porém, os alemães possuíam um patrimônio líquido de apenas 16.800 euros per capita - metade do observado na Itália.

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