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Abertura comercial: nova panacéia?

O Estado de S. Paulo, p. B-2, 22/05/2018

http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,abertura-comercial-nova-panaceia,70002318418

Antonio Corrêa de Lacerda*

            Vez por outra surge no debate público um mantra repetido à exaustão. O da vez, que seria a panaceia para todos os nossos males, é a abertura comercial. O tema não é novo. A abertura da economia brasileira começou há 30 anos, no final do governo Sarney e intensificada nos governos Collor e Fernando Henrique Cardoso. A promessa, incrivelmente repetida agora, sem qualquer autocrítica, era de que abrir nossas fronteiras induziria nossas empresas a ampliar a sua produtividade e competividade, dado o aumento da concorrência com os produtos importados.

            Desde então as alíquotas médias de importação caíram de mais de 40% para cerca de 12 a 13%, com algumas alternâncias. A indústria, de forma geral, modernizou suas plantas, adaptou modos de gestão para fazer frente à concorrência, tendo respondido positivamente ao desafio da abertura comercial realizada.

            A questão é que a melhora do ambiente sistêmico, ou seja, de todos aqueles fatores que independem das empresas, ou dos trabalhadores, mas que afetam a competitividade, não avançou na mesma velocidade. Condições macroeconômicas (juros, cambio e tributos), logística e infraestrutura, burocracia e instabilidade de regras, além de outros fatores que formam o chamado “custo Brasil” ainda estão longe das médias observadas nos países concorrentes. Particularmente na questão cambial, a política em diferentes governos desde então visou muito mais o objetivo de controle inflacionário do que induzir a geração de valor agregado local e as exportações.

            O discurso de que a indústria não investe em modernização e inovação cai no erro de identificar a raiz do problema, que não se restringe à ação microeconômica das empresas, mas um ambiente sistêmico desfavorável. O investimento de forma geral, responde á rentabilidade esperada, que no caso é prejudicada pelas condições adversas do ambiente.

            Da mesma forma, o argumento de que nossa economia é fechada, não resiste a uma verificação dos números. O saldo comercial de produtos manufaturados, por exemplo, que apresentava relativo equilíbrio até 2006 passou gradativamente a ser deficitário tendo atingido no ápice,  em 2014, o US$ 110 bilhões. Diante deste dado, como sustentar que nossa economia seja fechada?

            Infelizmente, a combinação de fatores adversos nos levou a uma desindustrialização precoce, sem gerar os benefícios associados, e pelo contrario, gerando perda capacidade de geração de valor agregado, de empregos de qualidade e tecnologia atualizada.

            Um programa sério discussão de uma maior abertura da economia para que atinja o interesse do desenvolvimento e não apenas uma nova panaceia, passa necessariamente por;

- condições macroeconômicas que favoreçam o desenvolvimento, leia-se câmbio, juros e questão fiscal, ajustadas ao padrão internacional;

- redução da burocracia, distorções tributárias e melhora da infraestrutura e logística;

- adotar politicas de competitividade (leia-se, politica industrial, politica comercial e de ciência, tecnologia e inovação), para fortalecer as vantagens existentes e criar novas;

- negociar a abertura de setores na economia brasileira mediante o acesso aos mercados internacionais.

            Partindo do ajuste das condições sistêmicas, é sim possível rever a estrutura das alíquotas, porem sem generalizações. É preciso começar com a desoneração dos insumos de forma a dotar a indústria de transformação de maior poder, ao contrario de estimular a concorrência via rebaixamento das tarifas de importação dos produtos finais. Aqui não se trata de “reinventar a roda”, mas de adotar práticas internacionais bem sucedidas. Mas, para isso é preciso se livrar de dogmas e sair do conformo da repetição de mantras que só tendem a criar falsas expetativas e nos desviar do debate do essencial.

*professor-doutor e diretor da FEA-PUCSP, conselheiro e ex-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), é coautor, entre outros livros, de “Economia Brasileira” (Saraiva). Site: www.aclacerda.com

Antonio Corrêa de Lacerda, Prof. Dr.

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