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John Williamson e o “Consenso de Washington”

“O Consenso de Washington já foi “aquela babaquice” reproduzida por Marcos Lisboa no início do governo Lula, citando a famigerada entrevista de Maria da Conceição Tavares. O vídeo mais visualizados do YouTube brasileiro sobre o tema o define como: um acordo que une FHC, Ciro Gomes e Lula aos donos do capital internacional. Dito isso, o Consenso de Washington é uma babaquice, uma conspiração ou mais uma reencarnação do neoliberalismo? A resposta: nenhum dos três.”

Paulo Silveira[2]

Faleceu no dia 11 de abril, aos 83 anos, em Maryland, nos Estados Unidos, o economista John Williamson, conhecido como o homem que cunhou o termo “Consenso de Washington”. Williamson se destacou com trabalhos inovadores nos campos de regimes cambiais, reformas monetárias e economia internacional em geral. Foi conselheiro do Fundo Monetário Internacional (FMI), entre 1972 e 1974, e passou parte da vida no Brasil, depois de casar-se com uma brasileira. 

Tive oportunidade de conhecê-lo em 2003, quando esteve na FAAP, ministrando palestra na Semana da Economia. Na época, já trabalhava para o Institute of International Economics (atual Peterson Institute for International Economics), think tank que promoveu, em 1989, o seminário no qual foi publicada uma relação de reformas indicadas a países da América Latina, inclusive o Brasil, e que incluía: 

1.      Controlar os déficits fiscais e evitar o imposto inflacionário;

2.      Priorizar o gasto público nas áreas de maior retorno econômico, p. ex., educação, saúde e infraestrutura;

3.      Reformar o sistema tributário, expandindo a base de incidência e cortando alíquotas marginais;

4.      Liberalizar as finanças, almejando o alcance de taxas de juros determinadas através dos mercados;

5.      Unificar as taxas de câmbio, atingindo níveis competitivos o suficiente para induzir o crescimento das exportações de bens não tradicionais;

6.      Substituir restrições comerciais por tarifas que, por sua vez, seriam progressivamente reduzidas;

7.      Abolir barreiras ao investimento direto externo;

8.      Privatizar empresas estatais;

9.      Abolir regulamentações prejudiciais à entrada de novas firmas ou à concorrência;

10.  Garantir o direito à propriedade, principalmente nos setores informais da economia; 

Lembro-me que fiquei com a sensação de que aquela figura afável e tranquila contrastava com o barulho gerado por uma criatura que o tornou famoso – a expressão “Consenso de Washington” – que parecia lhe causar desconforto quando mencionada por interlocutores. 

De fato, a expressão adquiriu dois significados além do original: a expressão passou a ser tomada também como o programa de organizações internacionais de Washington, em particular o FMI e o Banco Mundial, para os países que a elas recorriam; noutro sentido, passou a ser vista como a proposta neoliberal ou de fundamentalismo do mercado. 

Como observou Edmar Bacha (https://valor.globo.com/opiniao/coluna/tributo-a-john-williamson.ghtml), “ele reclamou por ter ficado com a fama de ser o pai de um consenso de Washington neoliberal, mesmo tendo escrito depois um novo artigo com ênfase nas falhas de mercado, na distribuição de renda e na conservação de recursos naturais, o qual teve pouco impacto”. 

 

Recordo-me também que Williamson reconheceu que a lista de 1989 já não era adequada, pois 14 anos depois, o mundo havia mudado e uma nova agenda precisaria ser construída. Nessa nova agenda, Williamson mencionava quatro temas: (i) a necessidade de uma política fiscal anticíclica, ou seja, de cortar impostos e expandir gastos públicos numa fase recessiva, fazendo o contrário quando o crescimento se acelera; (ii) a necessidade de manter o câmbio competitivo e de aumentar a poupança interna; (iii) a necessidade de apoio do governo a um sistema nacional de inovação, direcionado a todos os interessados e não à empresa A ou B; (iv) finalmente, mostrava preocupação com a distribuição de renda, que não entrou na lista de 1989 por não haver ainda um consenso em Washington em torno de sua relevância.  

A par dos aspectos incluídos nessa nova agenda, Williamson referiu-se à necessidade de uma melhora efetiva na educação, a uma reforma agrária (sem prejuízo dos direitos de propriedade), ao microcrédito e à redução do custo de criar empresas novas, tudo com a preocupação de tornar os pobres detentores de mais recursos com que possam trabalhar para sair da pobreza. 

Como se vê, 18 anos depois, suas sugestões permanecem incrivelmente atuais.




Luiz Alberto Machado - Economista, graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), é sócio-diretor da empresa SAM - Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas e diretor adjunto do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial. Foi presidente do Corecon-SP e do Cofecon.

[2] SILVEIRA, Paulo. Consenso de Washington e neoliberalismo. Disponível em https://terracoeconomico.com.br/consenso-de-washington-e-neoliberalismo/.

 

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