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Mainstream

Acabo de ler Mainstream. Lançado em 2012, havia me sido recomendado por dois grandes professores, Jair Marcatti e Martin Cezar Feijó. Espetacular análise do que acontece na guerra global das mídias e das culturas (subtítulo do livro), oferece uma visão apurada de um processo de mudança comportamental em curso no mundo todo, das culturas e mídias tradicionais (mainstream) para mídias alternativas e menos populares graças ao aparecimento das plataformas digitais.

O livro foi escrito pelo jornalista e pesquisador Frédéric Martel, que, durante cinco anos, viajou pelo planeta, visitando as capitais do “entertainment” com o objetivo de entrevistar mais de 1.250 protagonistas das indústrias criativas em 30 países, além de conhecer in loco estúdios de cinema, rádio e TV, gravadoras, editoras, agências de publicidade e universidades.

Considerando que o autor viajou por vários países para chegar ao texto definitivo, muitos aspectos acabam por prender a atenção do leitor. Alguns desses aspectos dizem respeito a peculiaridades da cultura de cada país visitado. Um dos que mais me chamaram a atenção refere-se à China: “Na China, é preciso saber esperar e voltar a fazer a mesma pergunta periodicamente, em todas as etapas de uma entrevista, sem insistir, mas sem nunca desistir, até finalmente obter a resposta”.

A fim de aguçar a curiosidade, reproduzo mais três trechos que também atraíram minha atenção de forma especial. O primeiro deles refere-se a Bollywood, a indústria cinematográfica da Índia, e sua estratégia para conquistar o mundo:

A Índia tem uma das economias mais dinâmicas do mundo, com um crescimento anual entre 6% e 8%. No setor das indústrias criativas e do cinema, o crescimento é ainda mais espetacular, superando 18% ao ano. “Nosso futuro está aberto, somos o segundo país mais populoso do mundo”, insiste Amit Khanna [diretor-presidente da Reliance Entertainment, uma das mais poderosas multinacionais indianas do setor das indústrias criativas e da mídia], que quer romper com a imagem do cinema indiano das décadas de 1960 e 1970, apreciado pela crítica e os festivais internacionais, como cinema do Terceiro Mundo, mas não levado muito a sério como indústria e como mercado.

O segundo refere-se à Rotana, grupo de mídia e entretenimento de Al Waleed, príncipe de sangue e membro da família real da Arábia Saudita:

A Rotana especializou-se em dois setores paralelos que contribuem para esse monopólio. Primero a Internet: o grupo investiu milhões de dólares em sites ultramodernos e na IPTV, a televisão por Internet. “Consideramos que a cultura e a informação, a música, os filmes, a televisão e os livros vão se tornar inteiramente digitalizados. Tudo vai se transformar completamente. É o que eu chamo de ‘telecotainment’, a mistura das telecomunicações com o entretenimento. Não haverá mais discos, livros, jornais, televisões, apenas telas ligadas à Internet”.

O terceiro, por fim, já na parte conclusiva do livro, diz respeito à relação entre arte, cultura e economia, tema extremamente sensível para muitos atores da economia criativa, e no qual a influência da Europa, que foi dominante por muito tempo, vem sofrendo acentuado declínio:

Será que a cultura, para ser valorizada, precisa estar necessariamente “fora” da economia e do mercado? Não é fato que setores inteiros da arte, na própria Europa, são regidos e produzidos pelo mercado (grande parte do cinema, da edição, da música, mas também da arte contemporânea)? Em si mesmo, assim, o mercado não seria bom nem mau para a cultura. Depende. É preciso analisar essas questões de maneira menos ideológica do que se tem feito até agora. As indústrias criativas valorizam os números, e não as obras, e não se pode discutir coma Billboard, a Variety ou a Nielsen Soundscan. É sobre essas mudanças de paradigma que os europeus precisam refletir.

Além desses três aspectos, o autor aborda muitos outros extraordinariamente atuais no fascinante mundo das mídias e das culturas, razão pela qual recomendo vigorosamente a leitura de Mainstream.

 

Luiz Alberto Machado - Economista, graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), é sócio-diretor da empresa SAM - Souza Aranha Machado Consultoria e Produções Artísticas. Foi presidente do Corecon-SP e do Cofecon.

 

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