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Ata manteve tom duro, com ênfase nos núcleos e nas expectativas de inflação ainda altas, dizem analistas

O Banco Central continua firme em sua posição de, ao decidir o rumo de sua política monetária, dar mais ênfase tanto aos comportamento da inflação subjacente – os núcleos que excluem componentes transitórios e mais voláteis dos índices de preços – e às expectativas de inflação para períodos mais longos do que para os indicadores correntes. Isso ficou claro, segundo analistas, na divulgação da Ata da última reunião do Copom, divulgada nesta terça-feira (9).

Para Rafaela Vitória, economista-chefe do Baco Inter, o tom do Comitê foi duro ao analisar a inflação acumulada em 12 meses, que tem mostrado desaceleração. “Ele (BC) desmerece muito a queda da inflação atual, inclusive a caracteriza como não relevante”, afirma, destacando que o foco permaneceu na expectativas, que ainda estão desancoradas.

Rafaela concorda quanto à questão das expectativas, mas questiona que o próprio Relatório Trimestral de Inflação de março já mostrou que a inflação nos últimos meses vem surpreendendo para baixo as expectativas tanto do BC como do mercado.

A economista também diz que o BC deu pouca importância ao fato de que o País está passando por um momento de queda da inflação acumulada de 12 meses que vai até junho, por conta das medidas de redução de impostos do ano passado. E que isso tende a trazer boas notícias na questão dos reajustes salarias de várias categorias entre abril e junho. No ano passado, setores como a construção tiveram reajustes na casa de dois dígitos.

Reajustes menores agora vão ter reflexo na inflação futura, prevê. “É o tal efeito de segunda ordem, tanto para cima, como para baixo também. O BC não considerou essa queda da inflação nos últimos meses no seu cenário atual. Ele está muito preso nas expectativas. Eu concordo que elas deterioraram, estão contaminadas, temos toda a questão do risco fiscal. Mas ele dá bem mais ênfase nisso do que na atual situação da queda da inflação”, comenta.

A economista-chefe do Banco Inter também concorda com a visão mais benigna que a diretoria do Copom tem do novo arcabouço fiscal, que precisa de ajustes e correções, pondera. “O arcabouço precisa de umas melhorias, principalmente na parte de garantias, de que vai ser executado. Mas tirou um risco maior de descontrole fiscal e de aceleração da inflação. O BC ressalta isso”, afirma, destacando que foi reforçada a mensagem que não existe relação mecânica entre queda de juros e arcabouço.

 

 

“Mas, se no final ele for aprovado e for mais positivo, pode impactar expectativas de inflação e, com isso, podemos ter um processo de queda dos juros mais acelerada”, diz Rafaela.

Ela afirma que dificilmente virá uma queda de juros na próxima reunião do Copom, em junho. “A Ata afasta qualquer chance, não há ali nenhum indício de discussão de afrouxamento monetário”, analisa.

Caio Megale, economista-chefe da XP, concorda que o tom da Ata mostra que mostram que o BC continua preocupado com a inflação e não dando nenhum sinal de que há espaço para corte de juros no curto prazo.

“O balanço final é de que o BC vem com uma sinalização dura a respeito da inflação. Talvez tenha até agregado algo a mais a medida em que menciona que a expectativas inflacionárias continuam subindo, apesar de todo o esforço. Vejo uma ata consistente com uma Selic ficando estável por um bom tempo. Esse parece o plano de voo do BC. Certamente nenhum sinal de corte de juros para a próxima reunião do Copom”, diz Megale em relatório da XP.

Para ele, agosto também não parece estar no radar para cortes, pelo menos por enquanto. “Vamos ver como evolui o cenário até lá. Alguns pontos adicionais importantes: a inflação no atacado tem caído bem, mas não é algo para agora”, pondera.

Megale também diz que a Ata reforça o ponto de que atitudes que possam pressionar as expectativas aumentam o custo da convergência da inflação, uma referência a possível à mudança de meta.

 

 

Com relação a atividade econômica, o economista da XP lembra que o BC vê a economia desacelerando, mas que retirou de seu comentário a parte de que o mercado de crédito poderia estar desacelerando de forma mais abrupta. “Parece que ele está mais convicto de que é uma desaceleração cíclica, sem algo a mais disfuncional e que a inflação está caindo de forma relativamente lenta”, afirma.

Sobre a parte fiscal, Megale lembra que o BC cita algumas vezes na Ata que existe relação mecânica entre a aprovação da proposta de arcabouço que está no Congresso e o movimento inflacionário, além da mudança da política monetária. “O BC está dizendo que, se votar amanhã o arcabouço fiscal, não significa que haverá corte juros na sequência. Precisaria avaliar os efeitos e a economia de forma geral”, explica.

A visão de Mauricio Oreng, superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander Brasil, é similar sobre o tom da Ata, ainda bastante focado na desancoragem das expectativas e sinalizando manutenção da estratégia atual de juro estável em patamar contracionista por período prolongado.

“O BC reforça o compromisso com a meta de inflação e reafirma a preocupação com os sinais de desancoragem e a inércia da inflação subjacente, ainda vista como subproduto de excesso de demanda nos serviços”, comenta.

Para ele, o Banco Central também voltou a reafirmar o princípio da separação de instrumentos, com a política monetária focada no combate à inflação e com medidas macroprudenciais buscando o bom funcionamento dos mercados financeiros e creditícios. “A desaceleração do crédito local ainda é vista como em linha com as expectativas do BC, dada a política monetária contracionista”, afirma.

Taxa de juros neutra

João Savignon, head de pesquisa macroeconomica da Kínitro Capital, no entanto, avalia a Ata como neutra em relação ao esperado e ao comunicado pós-reunião. “No comunicado, nossa avaliação é que o Copom tinha aliviado um pouco o tom da última reunião, vindo ligeiramente mais ‘’ do que esperávamos, por dois motivos: ter mantido inalteradas as expectativas de inflação, com revisão para baixo no cenário alternativo, e ter qualificado o cenário de possível retomada do ciclo de alta como menos provável”, afirma.

Segundo o analista, chamou a atenção, em especial, a atualização da discussão sobre a taxa de juros neutra – aquela que não acelera, nem desacelera a inflação. “Apesar de terem mantido inalterada, nos pareceu que essa discussão, de uma taxa de juros neutra maior, pode crescer nos próximos meses”, destaca.

Mirella Hirakawa, economista sênior da AZ Quest, também destaca esse ponto da Ata divulgada hoje. “Na vésperas do Relatório de Inflação, a expectativas é que teria alguma alteração de revisão da taxa de juros neutra para cima. E, na sinalização dessa Ata, a tendência é de manutenção de uma taxa de juros neutra em 4%”, afirma.

Para ela, isso significa que não existiram componentes adicionais ‘hawkish’ nesse período. “Dado que essa revisão de taxa de juros neutra não foi observada em março, ela poderia ser observada em junho e, portanto, postergaria possivelmente os cortes de taxa de juros”, avalia.

Mirella também destaca o ponto da Ata quando é analisada inflação corrente, em especial o comentário que a oscilação do headline, portanto do índice de inflação cheio, não deve ser tão relevante para suas decisões, quanto ponderada a inflação subjacente nesse período.

“Ambos os fatores corroboram nossa expectativa de início de corte da taxa de juros em agosto, uma vez que nas nossas projeções as medidas de inflação subjacente já devem apresentar alguma melhora”, prevê.

Sobre as expectativas de inflação, apesar dessa reunião do Copom em maio ter classificado o fator como “sem alteração significante”, a leitura da AZ Quest é que existem espaço e fatores que podem ajudar na queda das expectativas, principalmente as mais longas.

 

 

Felipe Izac, sócio da Nexgen Capital, também avalia que Ata divulgada netsa terça-feira, os diretores do BC mantiveram a mesma postura rígida das últimas reuniões. “A projeção de inflação segue inalterada e indicaram que continuarão a fazer de tudo para deixar a inflação dentro da meta”, comenta

Ele cita, no entanto, que o BC analisou que os cenários que poderia retomar um ciclo de aperto monetário se tornaram bem menos prováveis e reconheceu que a apresentação do arcabouço fiscal pelo governo reduz a incerteza associada a crescimento da dívida pública e a extremos riscos fiscais.

“Com essa ata, certamente não vemos uma sinalização do BC em realizar cortes na Selic na próxima reunião. Ainda é cedo para falar sobre a reunião de agosto, mas o mercado ainda não vislumbra a possibilidade de cortes no início do segundo semestre. Precisamos acompanhar a evolução fiscal e da inflação”, adverte.

Segundo Luca Mercadante, economista da Rio Bravo, ao contrário do que ocorreu nas últimas atas do Banco Central, o texto publicado hoje não aliviou o tom da autoridade monetária.

“O Copom seguiu duro com a inflação e reforçou, repetindo por 3 vezes, que a aprovação do arcabouço fiscal não implica na queda de juros.”

Além disso, afirma, voltou a discussão sobre a elevação da taxa de juros neutra. “O BC reconhece a possibilidade de um juro neutro mais alto, mas ainda não incorpora no seu cenário de referência, que se manteve bem próximo do apresentado na reunião anterior”, diz Mercadante.

Cenário externo

Andrea Damico, sócia e economista-chefe da Armor Capital, afirma que a ata foi muito bem escrita, pontuando bem os pontos mais importantes das discussões do comitê e até atenuando um pouco o tom do comunicado que se seguiu à decisão sobre os juros.

No cenário externo, ela cota como mais relevante o reconhecimento de um menor risco de um cenário de crise financeira mais extrema nos EUA e na economia global, embora tenham admitido uma desaceleração bastante intensa do crédito, principalmente nos EUA.

“Eles reforçam o ponto de que a inflação de serviços global segue resiliente, porém essa desaceleração do crédito tende a ajudar. Então o cenário global traz um ‘input’ interessante”, comenta.

Na economia doméstica, Andrea cita o reconhecimento que o BC faz na índices de inflação no atacado, os IPAs. “Eles explicitaram essa trajetória dos preços no atacado, que isso tende a colaborar com o processo de desinflação”, destaca.

Sobre as expectativas, a economista admite que a Ata do Copom mostrou uma preocupação, mas reconhecendo que houve uma estabilizada. “Um ponto em relação às expectativas que vale mencionar é que eles transparecem uma visão que talvez esperassem um arrefecimento das expectativas e não apenas a estabilização”, pondera.

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“O combo geral da Ata é mais ameno que o comunicado, principalmente por essa explicitação do cenário global, na margem um pouco mais desinflacionário, e pelo reconhecimento da inflação doméstica, dos preços no atacado e o quanto isso pode favorecer os próximos meses a inflação do consumidor”, afirma.

Em relação à questão do crédito, o dado de março vai muito na linha de que não tem nada fora do normal acontecendo, mas algo compatível com o ciclo econômico.

Para ela, o tom mais ameno que o comunicado, mas sem abrir espaço para uma queda de juros em junho. A Armor capital mantém sua projeção de início do ciclo de cortes em agosto.

Paciência

O C6 Bank diz em relatório que a comunicação do Banco Central e o cenário prospectivo para a inflação expostos na Ata sugerem manutenção da taxa Selic nos patamares atuais, pelo menor por ora.

“Esperamos elevação das metas de inflação à frente, provavelmente em junho, quando o CMN precisará decidir a meta de 2026, o que poderia abrir espaço para queda da Selic na segunda metade do ano. Projetamos Selic em 12,5% ao final de 2023 e 11% ao final de 2024”, prev~e o banco.

Em relatório assinado por Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para América Latina do Goldman, o banco afirma que sinalização da Ata e o tom geral não diferem de maneira material da declaração de política conservadora pós-reunião.

“A inflação projetada para o final de 2023 e 2024 não mudou em relação à reunião anterior e, portanto, permanece acima da meta de 2024. Para o Copom, o conjunto recente de indicadores segue em linha com o cenário básico de desaceleração da atividade, porém com maior resiliência do mercado de trabalho”, afirma o texto

Para o banco de investimentos, em um movimento ‘hawkish’, alguns diretores apontaram que potenciais taxas de juros neutras mais altas nas principais economias, a resiliência da atividade doméstica e um lento processo desinflacionário poderiam ser compatíveis com uma taxa neutra mais alta do que a assumida pelo Copom.

Nesse caso, o atual aperto monetário teria um impacto contracionista menor do que o implícito nos cenários básicos. “No entanto, a maioria dos diretores julgou que essa interpretação ainda parece prematura e precisa de maior corroboração por dados”, pondera.

 

 

O Goldman Sachs também diz que o Copom observou que a oferta de crédito parece compatível com o atual estágio do ciclo da política monetária, a despeito da persistência de um declínio mais profundo na oferta de crédito em modalidades específicas.

“O Copom antecipa moderação na oferta de crédito nos próximos meses, em linha com o que vem sendo observado em ciclos anteriores de aperto da política monetária”, afirma Ramos no texto.

Para ramos, a declaração de política pós-reunião e a Ata são consistentes com o Copom que permanece vigilante e conservador, uma vez que a busca pela desinflação é um trabalho em andamento e nem todas as incertezas vindas dos rumos da política fiscal foram removidas.

“Além disso, estamos agora em uma fase em que os ganhos da desinflação tendem a ser mais lentos, em um cenário em que as expectativas de inflação permanecem desancoradas. Em nossa avaliação, o cenário mais provável é que o Copom seja estável e paciente e mantenha a taxa básica de juros no atual patamar significativamente restritivo por mais algum tempo, prevê o Goldman Sachs.

“Consequentemente, esperamos que o Copom espere até a reunião de agosto para começar a cortar gradualmente, mas, devido às perspectivas instáveis da política fiscal e parafiscal e às expectativas de inflação flutuantes, não se pode descartar uma espera mais longa para começar a afrouxar”, alerta.

Na análise da Levante, o texto do a Ata veio bem mais sintético do que o da reunião anterior, com 22 itens, ante os 27 da Ata publicada no fim de março, com os membros do Comitê enfatizaram ainda a resiliência da inflação.

Segundo o relatório o texto é claro sobre o cenário atual, com a inflação ao consumidor continua elevada e os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária se mantendo acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta.

Mais do que isso, as perspectivas não são boas, segundo a Levante. Os analistas citam o parágrafo 11 da Ata, no qual é explicado que a dinâmica da desinflação segue caracterizada por um processo com dois estágios distintos.

No primeiro estágio, já encerrado, a velocidade de desinflação foi maior. Porém, no segundo estágio, que se observa atualmente, a velocidade de desinflação é menor e os núcleos de inflação, que respondem mais à demanda agregada e à política de juros, se reduzem em menor velocidade.

Para a Levante, o BC explica assim que a baixa recente da inflação pode ser explicada facilmente: a economia está finalizando a digestão da intervenção tributária nos combustíveis no ano passado, e isso baixou os preços.

“Porém, os impostos voltaram, e com isso os preços devem permanecer elevados. Além disso, a economia não está desacelerando e o setor de serviços, o mais importante para a economia, segue aquecido. Com tudo isso, há pouquíssimo espaço para reduzir os juros no curto ou no médio prazo”, conclui.

Já o Bank of America, em análise assinada por David Beker e Natacha Perez, afirma que a Ata tentou equilibrar o tom “hawkish” do comunicado, num tom um pouco menos belicoso.

O BofA diz que o Copom trouxe recados tanto para um o leitor “dovish” como para um leitor “hawkish”.

No primeiro caso, tratou de minimizar a probabilidade de um aumento da taxa de juros e citou que as incertezas fiscais diminuíram desde o restabelecimento dos impostos sobre os combustíveis e a apresentação da nova estrutura fiscal no Congresso.

“A aprovação de um projeto de lei sólido e crível foi destacada como chave para a redução das expectativas de inflação à frente. A deflação na inflação do produtor e o impacto limitado das dificuldades financeiras estrangeiras sobre os ativos locais também foram reconhecidos”, afirm o banco.

Pelo lado mais conservador, o BC continuou avaliando a possibilidade de aumentar sua estimativa de taxa de juros real neutra, em meio à resiliência da atividade, ao lento processo desinflacionário e ao risco de medidas parafiscais expansionistas. Mas optou por mantê-la em 4%. “As expectativas de inflação de longo prazo não ancoradas também foram destacadas, reforçando seu impacto negativo no processo desinflacionário”, diz o banco.

Para o BofA, a ata reforça uma expectativa de taxa Selic em 11,75% no ano de 2023, com um primeiro corte de 50 pontos-base em agosto.

“Os efeitos defasados acumulados do ciclo de aperto e do aperto do crédito local devem pesar nas decisões de política monetária à frente. Mantemos nossa visão recentemente revisada de que o BCB iniciará o ciclo de flexibilização em agosto, com um corte de 50 pb, e a Selic chegará a 11,75% em 2023 e 9,50% em 2024.”

Já o Itaú, em relatório assinado pelo economista-chefe Mario Mesquita, afirma que o Copom continuou interpretando que o balanço de riscos tem fatores que atuam em ambas as direções.

“O Comitê voltou a apontar a maior persistência das pressões inflacionárias globais como um risco ascendente e, na descrição do risco relacionado à frente fiscal, mencionou a incerteza ainda presente sobre o desenho final do quadro e, mais relevante para a política monetária, sua efeitos sobre as expectativas sobre as trajetórias da dívida pública e da inflação, bem como sobre os ativos de risco”, diz o texto.

O Itaú esperamos que o Copom inicie um ciclo de flexibilização gradual em sua reunião de outubro-novembro, levando a Selic a 12,5% até o final do ano. Segundo o banco, os próximos grandes eventos na frente de política monetária serão a audiência de confirmação dos novos conselheiros no Senado, as primeiras indicações do Copom na atual gestão, provavelmente na primeira quinzena de junho, e a decisão sobre o meta de inflação, até o final do mesmo mês.

Fonte : Infomoney

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