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Análise: Inflação nos EUA dá armas para Fed manter ritmo dos juros, mas crise bancária ainda pode interferir

Ilustração de pessoa carregando um símbolo de percentual

O dados da inflação do consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos Estados Unidos de fevereiro e os detalhamentos que mostraram uma resiliência de preços em serviços seriam razões técnicas suficientes para que o Federal Reserve mantivesse o ritmo de alta de 25 pontos-base na taxa de juros na semana que vem. Mas analistas alertam que novas notícias sobre a crise de liquidez de bancos regionais podem mudar essa percepção.

Nesta terça-feira (14) o escritório de estatísticas do Departamento do Trabalho divulgou que índice de fevereiro  foi de 0,40% na comparação mensal e de 6,0% em 12 meses, ambos exatamente em linha com as projeções.

O núcleo da inflação, que desconsidera as variações de alimentos e energia, subiu 0,5% no mês e 5,5% nos últimos 12 meses, este último ligeiramente acima das estimativas.

 

Se a análise hoje ficasse restrita apenas ao indicador e seus vários componentes, o diagnóstico dos especialistas seria de um lento processo de desinflação com algumas pressões relacionadas à demanda ainda forte por serviços.

Mas o colapso do Silicon Valley Bank (SVB) e do Signature Bank na semana passada e o eventual risco de contágio não só no setor como em outras áreas da economia entraram no radar do Fed e não podem ser desconsiderados, segundo as análise de bancos, corretores e gestoras de investimentos.

O economista Mohamed A. El-Erian escreveu hoje em sua conta no Twitter que a política do Fed hoje se resume a um trilema: reduzir a inflação, minimizar os danos ao crescimento e evitar instabilidades financeiras perturbadoras. “Nada fácil para um Fed que foi muito frouxo por muito tempo, descaracterizou a inflação, começou timidamente e pisou no freio”.

Para Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, o número de hoje perdeu muita importância porque a major preocupação da política economia dos EUA se tornou o contágio financeiro dessas quebras, como aconteceu em 2008.

 

 

“O índice hoje veio ruinzinho ainda, mas o Fed vai dar mais atenção a outras coisas que não só o combate à inflação”, comentou.

No entanto, Polydoro elogiou as rápidas respostas dadas no final de semana a respeito da proteção dos depósitos pelo Departamento do Tesouro, pelo fundo garantidor FDCI e pelo próprio Banco Central americano como importantes para manter a confiança no sistema. Isso pode dar à autoridade monetária um pouco mais de tranquilidade para tomar a decisão.

O economista da ASA ainda acredita que o Fed vai subir os juros em 25 pontos na próxima reunião. Mas mesmo que ocorram fatos novos sobre a crise dos bancos e os diretores tenham de decidir por uma pausa, com retomada do ciclo de aperto à frente, Polydoro disse não ver risco de perda de credibilidade do Fed.

Tudo isso, claro, depende informações difíceis de se obter, como o valor dos títulos que estão sob a posse dos bancos menores, o que poderia indicar riscos de insolvência.

O economista lembra ainda que a defasagem dos impactos da política monetária na economia é de seis meses e que nestes primeiro e segundo trimestres devem ser sentidos os efeitos da fase mais aguda, quando o Fed estava subindo as taxas em 75 pontos-base.

Francisco Nobre, economista da XP Investimenros, diz em relatório que os números de hoje trouxeram poucas surpresas, embora continuem a mostrar pressões inflacionárias persistentes, especialmente na categoria de serviços essenciais.

 

 

“Não fosse a turbulência no sistema bancário dos EUA, uma discussão entre um aumento de 25 bps ou 50 bps provavelmente continuaria até a decisão do Fed na próxima semana. No entanto, as preocupações com a estabilidade do sistema financeiro provavelmente terão prioridade e forçarão o Fed a adotar uma abordagem mais cautelosa em sua decisão de março”, comenta.

Ele afirma que as perspectivas para a política monetária nos EUA estão mais nebulosas do que nunca e que as decisões continuarão reféns das informações que chegam sobre a inflação, o mercado de trabalho e, principalmente, o sistema bancário.

O cenário base da XP continua sendo o de uma alta de 25 pontos-base, embora Nobre admita que os desenvolvimentos recentes, juntamente com o CPI relativamente bem-comportado de hoje, podem permitir que o Fed faça uma pausa, pelo menos temporariamente.

Isso acontecerá caso o choque no sistema financeiro se mostre um problema sistemático. Aí, o Fed não teria escolha a não ser flexibilizar as condições financeiras e aumentar a liquidez do mercado para amenizar o impacto sobre a economia agregada.

Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, também avalia que a situação para os diretores do Fed está complicada, mas diz que ainda é cedo para compreender a real dimensão dos problemas envolvendo o SVB sobre o sistema financeiro norte-americano.

“Ao mesmo tempo, a batalha contra a inflação continua e não acreditamos que seja o momento para afrouxar o discurso. A autoridade monetária deve seguir com parcimônia, entender a evolução da economia daqui para frente e tomar suas decisões a cada reunião”, comentou.

Sobre o CPI anunciado hoje, Sung destaca que é possível observar uma desaceleração nos últimos 12 meses nos preços de alguns grupos como energia e alimentos, mas alerta que os preços de moradia e aluguéis, além de serviços, voltaram a subir. “Este último tem gerado preocupação na autoridade monetária”, ressalta.

Ele afirma ainda que o cenário inflacionário é preocupante, pois ainda não dá sinais claros de convergência para a meta de longo prazo. E, apesar dos episódios recentes terem gerado um questionamento sobre o ciclo de alta de juros, a expectativa da Suno para a reunião da semana que vem é de um alta de 25 pontos-base.

Inflação enraizada

Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, afirma que, apesar de a magnitude da inflação acumulada em 12 meses estar desacelerando (o índice de 6,0% em fevereiro representou o  oitavo recuos seguido), os dados mensais mostram que os núcleos voltaram a acelerar nos últimos meses.

Isso denota, segundo ela, a característica preocupante do indicador, claramente pressionado pelo nível de demanda agregada da economia local.

“A taxa de juros atual não tem se mostrado capaz de contornar o processo de pulverização dessa inflação na economia local. Além disso, a retomada da aceleração dos núcleos da inflação sugere justamente que existe um processo contínuo de enraizamento dessa inflação em patamar elevado e definitivamente não é uma boa notícia para o Fed”, diz.

Para Diogo Saraiva, economista e sócio da Blueline, o núcleo de 0,5% do CPI de fevereiro mostrou uma abertura forte. “Mesmo com o componente de veículos usados continuando a contribuir negativamente para o core, esse veio acima do consenso, compara.

Fonte : Infomoney

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