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Negócios no esporte: o valor além do óbvio

Piloto da Red Bull, Sergio Perez posa com um torcedor no paddock antes do Grande Prêmio da Arábia Saudita de Fórmula 1 de 2022 (Clive Mason/Getty Images)


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Negócios, negócios, negócios. O esporte continua a ser uma área de interesse de investidores de todos os tipos, origens e bolsos. Nesta semana, vamos tratar de alguns movimentos anunciados na imprensa e como eles se conversam (ou não), com estratégias de negócios no esporte.

Começamos pela tentativa do fundo soberano da Arábia Saudita (PIF) de comprar a gestão da F1, que hoje está nas mãos da Liberty Media.

A suposta proposta pelo controle da modalidade teria sido de US$ 20 bilhões. Vamos lembrar algumas coisas: a Liberty Media comprou os direitos da F1 em 2017 por US$ 4,5 bilhões.

 

Desde então vimos uma revolução na modalidade, como o lançamento de um app próprio de transmissões e a estreia da série “Drive to Survive”, que trabalharam no aumento do interesse pela categoria a ponto de ela definitivamente conquistar o mercado americano. Sem contar a expansão pelo Oriente Médio – serão quatro provas na região na temporada 2023 – e a modernização do relacionamento com os fãs.

Apesar de ser 100% controlada pela Liberty Media, o Formula One Group tem ações do tipo “Tracking Stocks” na Nasdaq. Na última sexta-feira, o grupo valia US$ 16 bilhões, com receita anual estimada em US$ 2 bi e Ebitda de US$ 500 milhões.

Resumidamente, as tracking stocks geralmente tem pouco ou nenhum direito a voto, os recursos aportados servem apenas para pagamento de dívidas ou investimentos no próprio negócio e elas são uma forma de levantar capital para unidades de negócios específicas de grandes conglomerados. Algo, inclusive, que deveria ser pensado no Brasil quando falamos em clubes de futebol. Mas fica para um próximo artigo.

 

 

Quando os árabes oferecem um prêmio de 25% sobre o suposto valor de mercado da Fórmula 1, isso indica muitas coisas. Primeiro que trata-se de um negócio de exposição e interesse. A Arábia Saudita é dona da Aramco, uma das maiores patrocinadoras da categoria. O aumento da quantidade de corridas nos países árabes trouxe maior visibilidade a eles, e a Copa do Qatar coroou este momento de exposição.

Para a Liberty Media seria ótimo se apropriar de um ganho nominal de mais de quatro vezes o investimento inicial, num valuation de 40x o Ebitda de 2021. Por mais que siga crescendo – saímos de 20 corridas em 2017 para 23 em 2023, com maior exposição e crescimento de bases de fãs – há limites. Entre 2016 e 2022, as receitas cresceram 47% (de US$ 1,7 bilhão para US$ 2,5 bilhão).

Mas um dos aspectos relevantes para o comprador pode ser menos o financeiro e mais o apelo de exposição. Inclusive porque parte do crescimento recente da Fórmula 1 veio da maior exposição ao mercado norte-americano, que culminará no GP de Las Vegas em 2023.

Logo, nem todo investimento tem necessariamente que trazer retornos financeiros. Por vezes, ele vale simplesmente pelo fato de se tornar dono de algo que muitos admiram. Isso traz retornos de imagem e em negócios secundários. O esporte vira um veículo para outros ganhos.

Consolidação no Mundo do Streaming

Nesta semana, foi anunciado um acordo de compartilhamento de conteúdo entre Amazon Prime e DAZN, por meio do qual a Amazon Prime Video disponibilizará o conteúdo da DAZN a seus assinantes na Espanha e Alemanha, cobrando um valor adicional ao assinante.

A guerra do streaming vem gerando mudanças importantes na indústria. Depois de uma grande fragmentação de oferta, vimos o aumento do interesse nos esportes, primeiro com conteúdo gravado e depois com partidas ao vivo.

 

 

Agora começamos o que parece ser uma nova fase do streaming, que é a consolidação. O movimento de Amazon com DAZN vai nessa direção.

O DAZN fez enormes investimentos recentemente em aquisições de direitos na Europa, de forma a aumentar o porte e virar alvo de interesses. Não há dúvidas que a consolidação passa necessariamente pelos gigantes do setor, e a Amazon já se mostrou interessada em se tornar referência em termos de transmissões esportivas.

Outras empresas iniciaram um namoro com o esporte. A Disney já faz há anos com a ESPN e tem reforçado a aposta. A Apple entrou na MLB e na MLS. A Comcast já atua fortemente na Europa por meio da Sky. Temos a Paramount + (da gigante americana CBS) entrando no mercado. O acordo Amazon/DAZN se junta ao acordo Globo/Premiere/Amazon e vai criando musculatura.

No Brasil, ainda temos um mercado que está alguns passos atrás, na fase de pulverização das transmissões, mas que, em algum momento, deve seguir o rumo natural de maturidade de todas as indústrias, que é a consolidação.

Ou seja, muitas vezes a aceleração de crescimento não busca o retorno imediato operacional, mas sim o aumento de poder de mercado para aumentar o valor do ativo numa negociação futura. Vender o DAZN com três direitos gera menos valor que vende-lo com dez. Portanto, é preciso estar atento aos movimentos de hoje, mas com um olhar nas próximas jogadas.

Diversificar para explorar a marca

O Flamengo e o BRB anunciaram que o Banco Central autorizou a constituição de uma empresa para gerir o Nação BRB Fla, que é uma operação digital dentro do BRB.

Ainda há pouca clareza sobre o processo. Veja, alguns lugares anunciaram o Nação BRB Fla como um novo banco, outros o anunciaram como uma empresa que vai gerir o produto dentro do BRB. São coisas diferentes, que apontam para riscos diferentes, que vão da necessidade de disponibilizar patrimônio para cobrir eventuais problemas, até gestão e compartilhamento de custos.

Aqui há dois aspectos que precisam ser avaliados. O primeiro é a estratégia do Flamengo, que faz sentido. Num ambiente em que a profissionalização vai se tornando gênero de primeira necessidade, e ela vem associada a capital injetado por novos acionistas nas SAFs, buscar alternativas de ampliar receitas e entrada de recursos além do tradicional é imperativo.

A estratégia do Flamengo é positiva porque explora a marca, um mercado consumidor bastante grande, sem necessariamente abrir mão de participação acionária no clube.

Do ponto-de-vista tático, sem conhecer dados da operação além do número de correntistas, não dá para dizer muita coisa. Aliás, dá: é um mercado feroz, altamente concorrido, com players de bolso fundo e dispostos a perder dinheiro por algum tempo até que a operação estabilize.

Além disso, operar um banco é ir além de emitir cartão de crédito e oferecer uma conta sem tarifas. Há custos operacionais, os bancos ganham dinheiro operando serviços como seguros, crédito, fazendo o cliente consumir o cartão e pagar a conta. Gerir inadimplência é um trabalho duro.

Digamos, portanto, que a estratégia é interessante, mas ousada. Não lembro de nenhuma outra ação semelhante em outros mercados que tenha surtido resultados impressionantes, nem mesmo a de uso de serviços mais simples e “commoditizados”, como operação de celular pré-pago.

 

 

Inclusive nesse mundo dos bancos digitais nichados de clube fiz algumas análises nos primeiros negócios e ficava claro que o esforço para obter os resultados que eram vendidos era hercúleo, e até hoje nada muito promissor foi divulgado.

Independentemente disso, é uma alternativa que pode gerar novas receitas no futuro. Se bem estruturada, pode ser um golaço.

Ou seja, nem sempre os resultados vêm apenas da atividade básica. Ter uma visão de negócio ampla, que seja capaz de explorar múltiplas possibilidades é uma alternativa de adaptação a um mercado cada vez mais competitivo. É preciso apenas ponderar riscos e oportunidades, calibrando a expectativa.

No final, voltamos sempre a alguns conceitos básicos da vida: pedras que rolam não criam limo. Quem ainda não entendeu isso em 2023 tem mais de um problema para resolver.

Cesar Grafietti Economista, especialista em Banking e Gestão & Finanças do Esporte. 27 anos de mercado financeiro analisando o dia-a-dia da economia real. Twitter: @cesargrafietti

Fonte : Infomoney

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