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A Selic vai voltar a subir? Com temor sobre PEC da Transição, esperança de corte na taxa já em 2023 reduz

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Notas de Real (Marcelo Casal Jr / Agencia Brasil)

A apresentação da minuta da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição confirmou as expectativas dos agentes financeiros de que o rombo fiscal fora do teto de gastos proposto pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) seria grande – deve alcançar em torno de R$ 198 bilhões.

A proposta prevê “excepcionalizar” do teto de gastos R$ 175 bilhões para o pagamento do Bolsa Família de R$ 600 a partir de 2023, com adicional de R$ 150 por criança, sem um prazo determinado.

As sugestões apresentadas pela equipe de transição incluem ainda uma autorização para que parte das receitas extraordinárias fique fora do teto e possa ser redirecionada para investimentos, em um limite de R$ 23 bilhões. O texto ainda propõe retirar da regra do teto de gastos doações a universidades e fundos ligados à preservação do meio ambiente.

 

Diante da brecha fiscal que pode ser aberta, agentes financeiros passaram a reajustar as projeções para os juros neste ano e no ano que vem. No começo da tarde desta quinta-feira (17), a curva de juros futuros mostrava que a Selic poderia terminar o primeiro semestre deste ano em 14,50% ao ano, o que representaria uma alta de 0,75 ponto percentual em relação ao patamar atual.

Agentes também voltaram a prever uma leve elevação dos juros já na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central agendada para dezembro. Nesse mesmo horário, a curva precificava uma chance de que a Selic fosse reajustada em 0,25 ponto percentual no encontro do próximo mês, o que levaria a taxa para 14% ao ano.

Segundo o Relatório Focus divulgado nesta segunda-feira (14), a expectativa para a Selic no fim deste ano está em 13,75% ao ano e em 11,25% para o ano que vem. Anteriormente, economistas consultados pelo Focus projetavam que o Comitê de Política Monetária (Copom) poderia iniciar o ciclo de cortes a partir da reunião de junho de 2023.

 

Na visão de analistas do Morgan Stanley, o abandono da expectativa de cortes de juros nas projeções para 2023 é “justificada”. Segundo o banco, o prêmio de risco da inflação se deteriorou mais de 100 pontos-base (1,00 ponto percentual) ao longo das duas últimas semanas e agora está “mais alto do que os níveis vistos ao longo do todo o ciclo de alta e do fechamento de 2015”.

Para os especialistas do Morgan Stanley, isso sugere que há um risco de aumento nas expectativas para a inflação em 2024 nas pesquisas do Focus, que atualmente está com a projeção em 3,50%, o que deve fazer com que o BC mantenha uma postura hawkish (inclinada ao aperto monetário) por mais tempo – ou até opte por realizar altas adicionais da Selic.

“O mercado está vendo que o governo vai fazer uma [política] fiscal mais expansionista. A expectativa dos agentes sobre a inflação vai subir, devido à alta do câmbio e devido à falta de uma sinalização de controle de gastos por parte do novo governo. O BC deve ver isso e agir”, defende Marcello Freller, estrategista macro da XP.

 

O especialista observa que o Banco Central estará de olho nas expectativas de inflação para 2023 e 2024 e que ambas devem “sair de controle” nas próximas leituras do Relatório Focus, que reúne as estimativas de economistas consultados pela autoridade monetária.

 

Ao ser questionado se as casas devem voltar a aumentar as projeções para a Selic nos próximos dias, Freller diz que a XP deve “gradualmente” piorar as estimativas para a inflação e para a taxa básica de juros, mas que isso não deve ocorrer “de um dia para outro”. O mercado financeiro, na sua visão, deve esperar para ver como ficará o texto aprovado pelo Congresso.

 

“O importante é o que vai passar da PEC [de Transição]. O governo pediu R$ 200 bi, mas se passar R$ 50 bilhões a mais apenas, o mercado volta. O problema é que hoje não temos a confiança de que o Congresso será o responsável da sala”, alerta. “Estamos acostumados ao governo ser o fiscalista e o Congresso ser a parte que gasta. Será uma inversão [de papel] dos últimos governos”.

Em relatório enviado nesta manhã, a equipe de política da XP ressaltou que o “clima no Congresso” é para que a PEC seja “enxugada”. Segundo eles, a tendência é de que os parlamentares optem por construir um texto mais “enxuto”, que garanta a manutenção do programa social em R$ 600 para 2023.

A possibilidade de pagar o benefício de R$ 150 para crianças e de reajustar o salário mínimo — tudo isso pelo período de um ano — também devem se manter, afirmam os especialistas da corretora.

Fonte : Infomoney

 

Para além disso, a casa pondera que o PT enfrentará fortes dificuldades para avançar e assegurar tranquilidade orçamentária pelo período de quatro anos. Segundo os especialistas, Davi Alcolumbre, presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no Senado, deixou isso claro ao receber a proposta de Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente eleito.

“A mensagem foi de que não há ambiente político para se aprovar uma licença tão ampla de gastos com o Congresso atual, ainda formado por uma base bolsonarista majoritária”, observam os profissionais da casa.

Para os analistas, a ausência de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, no momento da entrega da proposta foi um “sinal da falta de apoio que ele [Lira] dará a essa versão da PEC”. No Senado, a corretora observa que há ainda “clima para retirar” o Bolsa Família do teto de gastos integralmente em 2023, mas que essa tese só terá chance de avançar em acordo com a Câmara, o que é “pouco provável”, na visão dos especialistas da XP.

 

Fabiano Zimmermann, gestor de renda fixa da ASA Investments, vai na mesma linha e acredita que o Congresso deve modificar o texto. “Esperamos que seja estipulado um prazo, que seja só para o ano que vem, e também que seja colocado um valor. O montante de R$ 200 bi é muito excessivo”, destaca.

O gestor afirma ainda que a casa ainda não alterou o cenário para a Selic, mas reconhece que as incertezas em relação ao cenário aumentaram. De acordo com o especialista, os fundamentos continuam sugerindo uma inflação de serviços em queda e uma desaceleração da atividade. Porém, a componente de expectativa inflacionária deve piorar e isso pesa muito na condução da política monetária, pondera. “O receio é de que o BC não consiga implementar o ciclo de cortes com o fiscal descontrolado”, alerta.

Mudanças na alocação

Em termos de alocação, Zimmerman conta que a ASA Investments realizou algumas alterações em seu portfólio recentemente. O gestor diz que reduziu taticamente as posições em prefixados com vencimento em cinco anos antes da discussão da PEC da Transição por acreditar que seria um período de muita instabilidade e de grandes ruídos.

Ele cita, por exemplo, que há indefinições em torno do novo arcabouço fiscal, dos nomes da nova equipe econômica e do texto final que sairá da PEC de Transição.

Por outro lado, a casa se mostrou mais otimista com a alocação em ativos atrelados à inflação. O gestor destaca que os títulos públicos indexados ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estão com taxas reais de 6% ao ano, o que ele considera como um patamar atrativo. Segundo ele, esse nível de juros não é “sustentável” no Brasil.

Na hora de escolher o prazo, o executivo da ASA Investments afirma que a curva dos títulos atrelados à inflação está praticamente “flat”, ou seja, sem grandes diferenças de retornos à medida em que os vencimentos aumentam. “Não há prêmio [juros adicionais] de alongamento e preferimos as NTN-Bs [Tesouro IPCA+] do ‘miolo’ da curva, com vencimento em 2026, por exemplo”, destaca.

Dan Kawa, CIO da TAG Investimentos, também conta que fez alterações na carteira pouco antes das eleições, quando Lula começou a se consolidar na liderança das pesquisas.

Ele destaca que a casa diminuiu “consideravelmente” a alocação em títulos prefixados e que está priorizando a posição em títulos atrelados à inflação na parte mais curta e intermediária da curva, ou seja, entre 2026 e 2030.

Segundo Kawa, as taxas das NTN-Bs estão atrativas e conseguem oferecer uma boa proteção em meio a um cenário de inflação “estruturalmente mais alta no País”. Ele diz que não é possível descartar uma mudança de postura do novo governo eleito em termos de política econômica.

“Por enquanto, estamos com uma postura mais defensiva não só pela questão do BC [ter que subir o juros], mas porque vai ter uma piora relevante da perspectiva fiscal nos próximos meses”, resume o CIO.

Prefixados também são vistos com cautela por Freller, da XP. Ele diz que se o Centrão conseguir aprovar a PEC da Transição com gastos extra-teto de R$ 100 bilhões, os ativos prefixados serão uma boa pedida.

O estrategista, no entanto, diz que não é possível descartar que a situação se inverta e que o gasto acima do teto ultrapasse esse valor no texto final da PEC, o que seria ruim para os prefixados. “É um indexador muito volátil. Pode ir muito bem, ou pode ir muito mal”, alerta o profissional ao dizer que o investidor precisa estar preparado.

Para o especialista, o momento não é bom para “chutes” e a maior segurança está nos pós-fixados atrelados à Selic, que podem se beneficiar de uma taxa básica de juros de 13,75% ao ano e que pode chegar a 14,50%, se a situação fiscal piorar de vez, como prevê a curva hoje.

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