Topo

Brasileiros “esquecem” R$ 2,4 bilhões em consórcios — e com cobrança de taxas, administradoras ficam com 34% disso

Real - Brazilian Currency. Money bills on a wooden table and a man holding a pen.
(Rmcarvalho/Getty Images)

SÃO PAULO – Quase R$ 2,4 bilhões foram “esquecidos” pelos brasileiros no sistema de consórcios em 2020. Os dados constam em relatório publicado recentemente pelo Banco Central.

Tecnicamente, esse dinheiro é conhecido como “recursos não procurados”. Segundo o Banco Central, trata-se de “valores financeiros pendentes de devolução a cotistas de grupos de consórcio encerrados”. Significa que eles pertencem a alguém que não os resgatou quando já poderia ter feito isso.

Um detalhe: desde 2008, quando entrou em vigor a Lei dos Consórcios (11.795), as administradoras estão autorizadas a cobrar uma taxa de permanência sobre os recursos não procurados. Só em 2020, isso rendeu R$ 823 milhões às instituições financeiras — o que corresponde a 34% do valor total esquecido pelos consorciados.

Na média, segundo o Banco Central, a taxa de permanência foi de 5,1% ao mês em 2020. No ano, a soma é de cerca de 61%. Significa que alguém que deixasse de resgatar R$ 1.000 de um consórcio já encerrado teria, um ano depois, apenas R$ 390 na conta.

O Banco Central não limita ou fixa os valores das taxas de permanência. A legislação determina apenas que suas condições estejam detalhadas no contrato de participação em grupo de consórcio.

A taxa de permanência média variou ao longo dos últimos anos. Chegou a ser de 5,8% ao mês em 2013 e de 4,9% em 2017. De 2013 para cá, período abrangido no relatório do Banco Central, o maior volume de recursos cobrados pelas administradoras sobre os recursos não procurados ocorreu em 2017 — foram R$ 866 milhões

Ano Taxa de permanência (% ao mês) Taxa de permanência (R$ milhões arrecadados ao ano)
2013 5,8% 672
2014 5,7% 574
2015 5,2% 678
2016 5,0% 769
2017 4,9% 866
2018 5,2% 813
2019 5,2% 805
2020 5,1% 823

Fonte: Banco Central

“Eventual abuso na fixação de preços é matéria de competência dos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, a exemplo dos Procons e do Departamento Nacional de Defesa do Consumidor (DPDC)”, segundo o Banco Central.

De onde vem o dinheiro esquecido?

 

Os recursos não procurados, de acordo com Paulo Rossi, presidente da Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios (Abac), são compostos principalmente pelo dinheiro de pessoas contempladas no consórcio que não foram resgatá-lo, pelas parcelas já pagas por pessoas que acabaram desistindo do produto, e também pelos valores depositados nos fundos de reserva, caixa comum existente em alguns grupos para fazer frente a despesas extras ou inadimplência de participantes.

Segundo executivos do setor, a principal fonte de recursos esquecidos são os casos em que o participante desiste do consórcio, seja porque teve uma redução de renda, seja porque perdeu o interesse na modalidade. Nesses casos, os valores já pagos não podem ser resgatados imediatamente – caso contrário, o funcionamento do grupo, que depende das economias de todos os membros  para que um ou alguns a cada mês sejam sorteados e adquiram o bem desejado, seria desestabilizado.

O desistente, que continua participando dos sorteios mensais, poderá receber o dinheiro de volta em duas situações: quando for contemplado ou quando o grupo terminar. Assim, se alguém fez um consórcio de 60 meses e parou de pagar as parcelas no 20º, precisará — na pior das hipóteses — esperar mais 40 para resgatar os recursos que já havia pago.

Ocorre que quando o prazo a esperar é tão longo, tudo pode acontecer no meio do caminho: o participante pode mudar de telefone e endereço, a conta corrente informada inicialmente pode ter sido encerrada, ele pode falecer, entre muitas outras possibilidades.

De acordo com o relatório do Banco Central, atualmente, 49,1% das cotas do sistema pertencem a consorciados “excluídos” dos grupos — seja porque desistiram, seja porque deixaram de cumprir obrigações financeiras contratuais. Segundo Márcio Kogut, CEO da Mycon, fintech de consórcio digital, significa dizer que, na prática, metade das pessoas que compram consórcios não chegam ao fim dos pagamentos. E quanto maior é esse percentual, maior tende a ser também o volume de recursos não procurados no futuro.

“Muitas vezes, os vendedores reforçam que as chances de contemplação são altas, gerando expectativas irreais no participante. Mas consórcio não é dinheiro rápido, não é capital de giro”, afirma Kogut. Na Mycon, segundo ele, que faz vendas apenas digitais, as desistências somam 13%.

Tags:

FENECON - Federação Nacional dos Economistas  
Rua Marechal Deodoro, nº 503, sala 505 - Curitiba - PR  |  Cep : 80.020-320
Telefone: (41) 3014 6031 e (41) 3019- 5539 | atendimento: de 13 às 18 horas | trevisan07@gmail.com e sindecon.pr@sindecon-pr.com.br